No
início do século XX, os Estados Unidos assinaram um contrato de arrendamento
perpétuo de uma porção de terra em Cuba, mais propriamente na baía de
Guantánamo. O arrendamento justificava-se, sobretudo, pelo “jogo de
influências», num contexto de Guerra Fria, e pelo interesse na mineração e
operações navais.
Porém,
não tardou para que a região arrendada pelos Estados Unidos se tornasse numa
prisão militar que, após o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001, se
transformou, por decisão do presidente George W. Bush, no centro prisional
principal para acolher os suspeitos de terrorismo.
Por
que razão os EUA fazem questão em manter uma prisão fora do território
nacional? Porque, dessa maneira, não precisam de cumprir com os direitos básicos
dos prisioneiros estabelecidos pelas leis norte-americanas.
Neste
seguimento, a prisão militar é local de torturas de vária espécie. Os
prisioneiros são sujeitos a frequentes interrogatórios onde se recorre a
práticas cruéis e degradantes de tortura e se obtêm confissões à força (música
alta, privação do sono, colocação dos presos em jaulas, isolamento na
solitária, simulação de afogamento, ameaças à família dos prisioneiros…).
Muitos dos detidos entram em greve de fome em protesto contra sua detenção sem
fim. Alguns perdem tanto peso que são obrigados a receber nutrientes líquidos
por tubos inseridos no nariz e que vão até o estômago. Várias reportagens
denunciam o abuso da força e o tratamento desumano que os guardas prisionais
utilizam contra os prisioneiros. Às frequentes agressões físicas, abusos
sexuais e completo desrespeito pelas práticas religiosas dos prisioneiros e
pelo Alcorão (batismo cristão em muçulmanos, fazer o detido comer carne de
porco, forçá-lo a comer na época do Ramadão…), acrescentam-se as condições
degradantes que se vivem na prisão (má alimentação, temperaturas muito
elevadas, existência de animais venenosos, como tarântulas e escorpiões…).
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Para
além de prisioneiros que supostamente serão terroristas, a Prisão de Guantánamo
abriga também prisioneiros de forma clandestina e que não têm razão
justificável para estarem detidos. Apenas alguns dos presos de Guantánamo estão
a ser julgados – e estes por uma comissão militar que tão pouco funciona de
acordo com os padrões internacionais de um julgamento justo.
De
facto e, contra nós próprios falando, desde o 11 de setembro de 2001 que é
mantida, conscientemente, pelos ocidentais, uma confusão insidiosa entre Islão,
Islamismo e terrorismo. Neste seguimento, as ações terroristas têm servido de
pretexto aos Estados, nomeadamente ao Estado norte-americano, para imporem
medidas que afetam os direitos humanos, restringindo as liberdades civis,
utilizando a repressão indiscriminada ou a tortura, como na referida prisão de
Guantánamo.
Ao
mesmo tempo que mantêm o campo prisional de Guantánamo em funcionamento, os
Estados Unidos continuam a proclamar o seu compromisso e respeito pelos padrões
internacionais de direitos humanos. Se qualquer outro país tivesse um tal vazio
de direitos humanos como o de Guantánamo, é certo e seguro que estaria a ser
criticado pelos Estados Unidos.
Assim
que assumiu o mandato, fechar o centro prisional de Guantánamo constituiu-se
como uma das promessas eleitorais do presidente Barack Obama. O grande problema
é que o Congresso aprovou uma série de obstáculos para impedir o fecho da
prisão em Cuba e, mesmo que Obama consiga iniciar um processo de
desmantelamento da prisão, é possível que não consiga completá-lo antes do fim
de seu mandato, em janeiro de 2017.
Tais
atropelos aos direitos humanos fazem-me concordar com alguns críticos
norte-americanos que defendem que, a partir de 2002, a democracia de velho
tipo- imaginada pelos autores da Declaração da Independência e da Constituição
dos EUA- efetivamente chegou ao fim, para gerar o “Estado teocrático fascista
americano”. Que diferença existirá entre os campos de concentração de Auschwitz
e Guantánamo? Praticamente nenhuma: todos são produtos do fascismo.