terça-feira, 2 de junho de 2015

O fascismo americano


No início do século XX, os Estados Unidos assinaram um contrato de arrendamento perpétuo de uma porção de terra em Cuba, mais propriamente na baía de Guantánamo. O arrendamento justificava-se, sobretudo, pelo “jogo de influências», num contexto de Guerra Fria, e pelo interesse na mineração e operações navais.

Porém, não tardou para que a região arrendada pelos Estados Unidos se tornasse numa prisão militar que, após o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001, se transformou, por decisão do presidente George W. Bush, no centro prisional principal para acolher os suspeitos de terrorismo.

Por que razão os EUA fazem questão em manter uma prisão fora do território nacional? Porque, dessa maneira, não precisam de cumprir com os direitos básicos dos prisioneiros estabelecidos pelas leis norte-americanas.

Neste seguimento, a prisão militar é local de torturas de vária espécie. Os prisioneiros são sujeitos a frequentes interrogatórios onde se recorre a práticas cruéis e degradantes de tortura e se obtêm confissões à força (música alta, privação do sono, colocação dos presos em jaulas, isolamento na solitária, simulação de afogamento, ameaças à família dos prisioneiros…). Muitos dos detidos entram em greve de fome em protesto contra sua detenção sem fim. Alguns perdem tanto peso que são obrigados a receber nutrientes líquidos por tubos inseridos no nariz e que vão até o estômago. Várias reportagens denunciam o abuso da força e o tratamento desumano que os guardas prisionais utilizam contra os prisioneiros. Às frequentes agressões físicas, abusos sexuais e completo desrespeito pelas práticas religiosas dos prisioneiros e pelo Alcorão (batismo cristão em muçulmanos, fazer o detido comer carne de porco, forçá-lo a comer na época do Ramadão…), acrescentam-se as condições degradantes que se vivem na prisão (má alimentação, temperaturas muito elevadas, existência de animais venenosos, como tarântulas e escorpiões…).


Para além de prisioneiros que supostamente serão terroristas, a Prisão de Guantánamo abriga também prisioneiros de forma clandestina e que não têm razão justificável para estarem detidos. Apenas alguns dos presos de Guantánamo estão a ser julgados – e estes por uma comissão militar que tão pouco funciona de acordo com os padrões internacionais de um julgamento justo.

De facto e, contra nós próprios falando, desde o 11 de setembro de 2001 que é mantida, conscientemente, pelos ocidentais, uma confusão insidiosa entre Islão, Islamismo e terrorismo. Neste seguimento, as ações terroristas têm servido de pretexto aos Estados, nomeadamente ao Estado norte-americano, para imporem medidas que afetam os direitos humanos, restringindo as liberdades civis, utilizando a repressão indiscriminada ou a tortura, como na referida prisão de Guantánamo.

Ao mesmo tempo que mantêm o campo prisional de Guantánamo em funcionamento, os Estados Unidos continuam a proclamar o seu compromisso e respeito pelos padrões internacionais de direitos humanos. Se qualquer outro país tivesse um tal vazio de direitos humanos como o de Guantánamo, é certo e seguro que estaria a ser criticado pelos Estados Unidos.

Assim que assumiu o mandato, fechar o centro prisional de Guantánamo constituiu-se como uma das promessas eleitorais do presidente Barack Obama. O grande problema é que o Congresso aprovou uma série de obstáculos para impedir o fecho da prisão em Cuba e, mesmo que Obama consiga iniciar um processo de desmantelamento da prisão, é possível que não consiga completá-lo antes do fim de seu mandato, em janeiro de 2017.

Tais atropelos aos direitos humanos fazem-me concordar com alguns críticos norte-americanos que defendem que, a partir de 2002, a democracia de velho tipo- imaginada pelos autores da Declaração da Independência e da Constituição dos EUA- efetivamente chegou ao fim, para gerar o “Estado teocrático fascista americano”. Que diferença existirá entre os campos de concentração de Auschwitz e Guantánamo? Praticamente nenhuma: todos são produtos do fascismo.



José Pedro Pinto, 4 

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