sábado, 25 de abril de 2015

Rotina


Foi num 25 de abril como o deste sábado, mas há 40 anos e numa liberdade então recentemente tomada: a 25 de Abril de 1975, Portugal testemunhou as primeiras eleições livres e universais após quase meio século de ditadura. As primeiras eleições livres realizadas em Portugal, para a Assembleia Constituinte, foram também as mais concorridas dos últimos 40 anos. No dia 25 de abril de 1975 votaram 91,5% dos portugueses maiores de 18 anos, homens e mulheres, a esmagadora maioria pela primeira vez. Nunca mais foram tantos deitar o voto na urna. Vão, aliás, cada vez menos.


Isto explica-se pela rotina. E se há dia nacional que já entrou na rotina é o 25 de Abril. A rotina dos discursos politicamente corretos ou ideológicos, a rotina da partidarização da data histórica, a rotina das manifestações de bandeira vermelha e cravo ao peito, a rotina. Neste ano, com promessa de chuva, os portugueses não rumaram às praias de fim-de-semana, mas certamente que irão trocar as manifestações pelos centros comerciais, como já vem sendo hábito.

Quatro décadas depois, as liberdades e conquistas de abril fazem parte tão integrante da rotina que também a democracia sai prejudicada. Dando particular atenção à rotina da liberdade de voto (até porque, durante esta semana, tomei conhecimento, por uma carta do Ministério da Administração Interna, do meu número de eleitor), constata-se que os portugueses tendem, cada vez mais, a renunciarem ao direito de voto.

Por muito que nos custe perceber, o poder do voto é a melhor forma de nos defendermos do livre arbítrio dos poderes instituídos. Com o voto determinamos quem, em nosso nome, deve exercer o poder de legislar, executar e fiscalizar. A cada cidadão exige-se igualmente que se mantenha informado para que possa votar em consciência.

Abster-se também é uma opção, mas está longe de ser a melhor das soluções, porque isso significa que optamos por deixar para todos os outros o poder de decidir quem nos representa.

A liberdade de voto passa igualmente por votar em branco ou anular o voto como forma de protesto, mas esse voto não contribui diretamente para a escolha que temos de fazer em cada eleição.


Votar é um direito, mas em Portugal não é um dever. Há países onde o voto é obrigatório, e não há relatos de que a democracia funcione melhor aí do que funciona por cá. Tornar obrigatório o voto não seria nunca uma solução, porque a consciência não se impõe. É crucial a distinção entre o direito e o dever de fazer uma opção. No dever de a fazer deve estar também o direito de não a fazer. Ou seja, não votar tem as mesmas consequências que votar branco ou nulo e deve manter-se como opção, mesmo que isso signifique que outros escolhem por nós.

A julgar pela mentalidade do povo português e por algumas discrepâncias que ainda subsistem no que diz respeito ao direito à informação, deve manter-se a tendência nas próximas eleições legislativas. Ainda assim, fica o apelo para contrariar a rotina e acorrer às próximas eleições com a assiduidade, a crença e a esperança de há 40 anos atrás.

José Pedro Pinto, 4


Sem comentários:

Enviar um comentário