Os últimos dias têm sido marcados por um bárbaro ataque terrorista à
sede do jornal francês Charlie Hebdo. Escudados na religião e tendo como
objectivo atacar a liberdade de expressão e espalhar o medo, três homens
levaram a cabo um atentado que vitimou alguns dos principais cartoonistas do
Charlie Hebdo, dois polícias, o porteiro do jornal entre outras vítimas. E
perante um dos mais chocantes ataques a um dos pilares da democracia- a
liberdade- o mundo uniu-se, olhou nos olhos do medo e respondeu de forma clara
e inequívoca: “Je Suis Charlie”! Mas, se houve gente que ficou profundamente
emocionada e revoltada com o cruel atentado, também se ouviram críticas aos
cartoonistas do Charlie Hebdo por se terem "posto a jeito”. Esta discussão
levanta questões polémicas e, a meu ver, muito pertinentes: Terá o humor e a
liberdade de expressão limites? E, se sim, quais serão esses limites?
Neste caso concreto, muito se tem falado do humor negro e da sua legitimidade. Uns gostam, outros não gostam. É um estilo que
baralha o nosso cérebro porque mexe com muitos dos ideais que a sociedade nos
incutiu. Nos últimos anos tem angariado cada vez tem mais público em Portugal e
a prova disso é a nova geração de humoristas desta vertente. Para os mais
distraídos, há uma série com uma grande dose de humor negro que chega à
televisão portuguesa há mais de uma década com uma enorme legião de fãs: Family
Guy. Tem excelentes exemplos do que é fazer bom humor negro com piadas sobre o
HIV, piadas de cancro, morte e toxicodependência. É ofensivo? Não, são apenas
piadas e das boas. Se devemos brincar com estes temas? Porque não? Ao fim ao
cabo, todo o humor visa alguém ou alguma coisa. Um exemplo: podemos fazer
piadas sobre sacos de plástico, à partida, é um tema inofensivo. Mas se
pensarmos bem, há quem já tenha morrido sufocado com um saco de plástico, e
agora?
Mas, associar o caso do Charlie Hebdo ao humor negro, parece-me bastante redutor, até porque a especialidade do jornal é a sátira política e
social. A questão essencial está na liberdade
de expressão e nos famosos "limites do que se pode ou não dizer" que
tantos gostam de apregoar. Na minha opinião, não deve nem pode haver limites
para uma piada ou para uma opinião. O limite tem de ser sempre auto-imposto
pelo bom senso e bom gosto de quem escreve a piada. O dia em que um humorista
se auto-censurar porque tem medo de represálias por causa de uma piada, é o dia
em que ele deixa de ser humorista e passa a ser mais um que segue o rebanho em
silêncio com o olhar fixo no chão e envergonhado com a falta de coragem que
tem. O humor negro tem de continuar, sem sombra de dúvida, assim como todas as
outras formas de se fazer humor.
Em nome
da liberdade de expressão, não nos podemos vergar. Jamais. Como disse
Voltaire, "Posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até a morte
o teu direito de dizê-lo."
José Pedro Pinto
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