quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Os Limites do Humor





Os últimos dias têm sido marcados por um bárbaro ataque terrorista à sede do jornal francês Charlie Hebdo. Escudados na religião e tendo como objectivo atacar a liberdade de expressão e espalhar o medo, três homens levaram a cabo um atentado que vitimou alguns dos principais cartoonistas do Charlie Hebdo, dois polícias, o porteiro do jornal entre outras vítimas. E perante um dos mais chocantes ataques a um dos pilares da democracia- a liberdade- o mundo uniu-se, olhou nos olhos do medo e respondeu de forma clara e inequívoca: “Je Suis Charlie”! Mas, se houve gente que ficou profundamente emocionada e revoltada com o cruel atentado, também se ouviram críticas aos cartoonistas do Charlie Hebdo por se terem "posto a jeito”. Esta discussão levanta questões polémicas e, a meu ver, muito pertinentes: Terá o humor e a liberdade de expressão limites? E, se sim, quais serão esses limites?


Neste caso concreto, muito se tem falado do humor negro e da sua legitimidade. Uns gostam, outros não gostam.  É um estilo que baralha o nosso cérebro porque mexe com muitos dos ideais que a sociedade nos incutiu. Nos últimos anos tem angariado cada vez tem mais público em Portugal e a prova disso é a nova geração de humoristas desta vertente. Para os mais distraídos, há uma série com uma grande dose de humor negro que chega à televisão portuguesa há mais de uma década com uma enorme legião de fãs: Family Guy. Tem excelentes exemplos do que é fazer bom humor negro com piadas sobre o HIV, piadas de cancro, morte e toxicodependência. É ofensivo? Não, são apenas piadas e das boas. Se devemos brincar com estes temas? Porque não? Ao fim ao cabo, todo o humor visa alguém ou alguma coisa. Um exemplo: podemos fazer piadas sobre sacos de plástico, à partida, é um tema inofensivo. Mas se pensarmos bem, há quem já tenha morrido sufocado com um saco de plástico, e agora?

Mas, associar o caso do Charlie Hebdo ao humor negro, parece-me bastante redutor, até porque a especialidade do jornal é a sátira política e social. A questão essencial está na liberdade de expressão e nos famosos "limites do que se pode ou não dizer" que tantos gostam de apregoar. Na minha opinião, não deve nem pode haver limites para uma piada ou para uma opinião. O limite tem de ser sempre auto-imposto pelo bom senso e bom gosto de quem escreve a piada. O dia em que um humorista se auto-censurar porque tem medo de represálias por causa de uma piada, é o dia em que ele deixa de ser humorista e passa a ser mais um que segue o rebanho em silêncio com o olhar fixo no chão e envergonhado com a falta de coragem que tem. O humor negro tem de continuar, sem sombra de dúvida, assim como todas as outras formas de se fazer humor.

Em nome da liberdade de expressão, não nos podemos vergar. Jamais. Como disse Voltaire, "Posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-lo."




José Pedro Pinto


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